Reportagem publicada pela revista Pequenas Empresas & Grandes Negócios
No post de hoje, traremos uma importante reportagem sobre o mercado livre de energia e como podemos nos beneficiar dele.
Empresas podem selecionar o fornecedor, negociar contrato e até escolher as fontes de energia
Empresas que gastam acima de R$ 10 mil por mês com conta de energia podem escolher de quem comprar, optar por fontes renováveis e economizar até 30%. A abertura do ambiente livre de comercialização energética começou a valer no dia 1º de janeiro e dá ao consumidor a possibilidade de selecionar o fornecedor para negociar as condições do próprio contrato.
A mudança foi definida pela portaria 50/2022 do Ministério de Minas e Energia e vale para estabelecimentos ligados à rede de alta tensão com demanda inferior a 500 kW.
Dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) indicam que o Brasil possui 165 mil unidades consumidoras com potencial de migração. Até então, elas só podiam ser clientes das distribuidoras locais.
“Qualquer padaria ou restaurante, por exemplo, pode ser beneficiado nessa nova rodada de abertura do mercado de energia”, afirma Rodrigo Ferreira, presidente-executivo da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel). Após a migração, é possível reduzir o gasto em até 30%, de acordo com a organização.
Para fazer a mudança, são necessários uma análise técnico-econômica e, em alguns casos, o investimento em infraestrutura, destaca Mariana Amim, diretora de assuntos técnicos e regulatórios da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace). Mesmo diante desse desembolso, ela afirma ser possível “ter ganhos extraordinários”.
Além de contar com condições comerciais melhores, o consumidor passa a ter liberdade de optar pela fonte do recurso. “Posso escolher não comprar energia gerada a partir de combustíveis fósseis e direcionar meu interesse para fontes renováveis, alternativa essa que não tenho quando estou comprando da distribuidora”, diz Marcio Trannin, vice-presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
Não é possível, contudo, comprar diretamente do gerador de energia. O consumidor com demanda inferior a 500 kW tem de ser representado por um comercializador varejista. Confira o passo a passo para economizar com o mercado de energia.
- Escolha o seu representante
O comercializador varejista é quem representará a empresa na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), entidade que contabiliza quanto cada agente comprou, vendeu, gerou e consumiu de energia.
Além disso, informa Rodrigo Ferreira, da Abraceel, “ele fica responsável por tudo o que acontece lá dentro. São diversas normas, prazos e detalhes técnicos com que o consumidor não vai precisar se preocupar”, diz.
Atualmente, há 87 comercializadoras varejistas em atuação no país – a lista está no site da Abraceel (abraceel.com.br). Elas são responsáveis pela compra de energia nas comercializadoras (são 515 em operação), pela gestão do uso e pela intermediação entre o consumidor e a CCEE.
A remuneração do agente é baseada no lucro obtido entre o valor pago à comercializadora e o preço de venda ao consumidor.
Na hora de buscar um representante, a dica é dar preferência a empresas já estabelecidas e com experiência no mercado, segundo Mariana Amim, da Anace. “É também preciso que ele apresente uma capacidade financeira consolidada, para que nenhuma afetação de mercado possa balançar a estrutura [da empresa].”
- Estude o mercado
Se até então não havia espaço para negociação ou decisão, agora é possível fazer a gestão do serviço de fornecimento de energia. Mas é preciso entender como ele funciona para tirar o melhor proveito.
Mesmo com o respaldo do comercializador varejista, que irá apoiar o processo de migração, para a negociação do preço é importante conhecer o custo individual de cada item, como os da energia e de sua distribuição, de garantia, de inadimplência e com a gestora, além dos encargos pagos à CCEE.
“Entender a dinâmica do mercado e quais são os papéis da empresa e do comercializador varejista são os primeiros pontos”, destaca a diretora da Anace.
A executiva indica como principais fontes de informação a Aneel e a Abraceel. A última, vale destacar, elaborou uma cartilha (bit.ly/4854rR5) para auxiliar o consumidor na compreensão do funcionamento do mercado livre de energia elétrica.
- Planeje sua migração
Um dos serviços de uma comercializadora varejista é fazer a análise de viabilidade econômica, que consiste em verificar seu perfil de consumo, identificar especificidades e elaborar escopos de produtos e serviços que se adequem a essas demandas.
Nessa etapa, podem ser necessários alguns investimentos. A Anace estima que, em média, a adequação dos sistemas de medição de energia para a migração para o mercado livre custe entre R$ 10 mil e R$ 20 mil. Esse valor varia conforme a concessionária e o projeto. Se houver a necessidade de um ajuste para segurança operacional, o desembolso pode ser maior.
Depois de acertar todos os detalhes do contrato com o agente, é preciso avisar a distribuidora. Essa comunicação, chamada de denúncia de contrato, deve ocorrer com o prazo mínimo de seis meses. Esse é o tempo necessário para que a distribuidora local prepare sua saída da rede e para que seu contrato não seja renovado automaticamente por mais 12 meses.
- Busque economia
Após viabilizar sua saída do mercado local, é hora de efetivar seu contrato de compra de energia, o que pode ser feito durante ou após o processo de migração. Nessa fase, são definidos valores.
Em média, a economia é de 20%, podendo chegar a 30% do custo total mensal, segundo estimativas da Abraceel. Ou seja, uma empresa que gasta R$ 50 mil de energia por mês no mercado regular pode reduzir para R$ 35 mil no mercado livre.
Quanto mais longo, mais vantajoso pode ser o acordo com o fornecedor. Segundo a Abraceel, em média, os contratos variam entre 6 meses e 2 anos (26,3% dos consumidores no mercado livre) e entre 4 e 10 anos (28,9%). Também é possível fazer acordos mensais ou semestrais (5,4%).
Uma estratégia bastante comum é ter mais de um contrato em vigência, explica Marcio Trannin, vice-presidente da Absolar. “Posso fazer um acordo a longo prazo prevendo o fornecimento de 90% do meu consumo, para garantir um bom preço, e para os outros 10% eu faço negociações competitivas de curto prazo”, diz.
- Ganho de previsibilidade
Ao fechar o pacto bilateral de fornecimento de energia para os próximos anos, o consumidor se protege de flutuações nos valores, já que define o indexador de reajuste. Ele pode estar baseado, por exemplo, na variação de inflação ou no preço da energia no mercado regulado.
De qualquer forma, o empresário passa a saber quanto vai pagar pelo custo da energia e deixa de estar sujeito às mudanças repentinas que acontecem na revisão das bandeiras tarifárias de energia.
“Quando você está conectado a sua distribuidora local, está pagando a tarifa que é determinada e regulada pela Aneel naquele ano. Não tem como prever as variações”, destaca Trainn. Quem está no mercado livre não arca com os custos das bandeiras. E essa maior previsibilidade auxilia no planejamento orçamentário das empresas.
- Flexibilidade de fornecimento
Empresas que dão férias coletivas ou que precisam incrementar a produção sazonalmente têm maior maleabilidade ao definir o contrato com o fornecedor, já que é possível programar interrupções temporárias ou acréscimos nas quantidades comercializadas.
“As cláusulas de flexibilidade no fornecimento também contribuem para saber o que acontece quando o consumidor utilizar uma quantidade maior ou menor de energia em relação ao que foi contratado”, destaca o vice-presidente da Abraceel.
Também é possível modular o contrato prevendo uma possível oscilação entre 80% e 120% do consumo habitual, sem correr o risco de sofrer uma exposição no mercado.
Imagine que, em determinado período, a empresa precisou consumir um volume de energia maior do que a contratada, sem que isso esteja previsto no acordo inicial. Nesse caso, o consumidor não corre o risco de desabastecimento, mas pode precisar pagar um valor extra para adquiri-la no mercado de curto prazo e pagar um preço maior por isso.
- Liberdade de escolha
No ambiente livre de contratação, além do direito escolher o fornecedor com melhores preços e mix de serviços, o consumidor tem a liberdade de definir qual tipo de energia contratar, o que não é possível no mercado regular. Pode escolher, por exemplo, apenas empresas que forneçam o recurso a partir de fontes renováveis.
Segundo o boletim Energia Livre da Abraceel, divulgado em novembro de 2023, o mercado livre absorve 56% de toda a produção de usinas de geração de energia renovável especial, o que inclui eólica, solar centralizada, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas. O volume representa uma alta de 16 pontos percentuais se comparado ao mesmo mês do ano anterior.
“Para muita gente, isso pode não ser relevante, mas para uma boa parcela da população é”, destaca o vice-presidente da Absolar. Ele explica que as fontes renováveis devem ganhar bastante destaque neste novo cenário, sobretudo com o crescimento da cultura ESG (sigla em inglês para governança corporativa, social e ambiental) nas empresas. “Elas não são apenas mais limpas, mas também mais competitivas [em preço].”
- Fonte alternativa de renda
Ao assinar um acordo com um comercializador ou gerador do mercado livre, você está fechando um contrato financeiro. Segundo Trannin, consumidores mais experientes e que se aprimoram nessa área podem enxergar o mercado como fonte alternativa de renda, já que é possível vender a quantidade excedente de energia contratada.
“Em certos lugares do mundo, sobretudo nos países mais desenvolvidos, existe a demand response [do inglês, resposta à demanda]”, explica. “Em situações de racionamento e estresse energético, os consumidores reduzem o consumo e vendem o que sobra em contratos de curto prazo, que costumam ser mais caros”.
Nesses casos, a intermediação também é feita por meio de um comercializador varejista. “Talvez o pequeno empresário não se interesse no primeiro momento, mas muitos consumidores industriais ganham dinheiro com isso”, diz o especialista.
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